Primeiramente, gostaria de agradecer ao João Ferreira a oportunidade de poder escrever sobre uma de minhas paixões. Paixão que me maltrata, mas que não expira.
Recentemente, o jogador Emerson Sheik deu uma declaração na qual ele fala da necessidade do clube de "resgatar valores". Fiquei com isso desde então na cabeça. Fiquei imaginando no que um atleta que se apresenta para jogar no glorioso pensa sobre vestir essa camisa. Qual o valor agregado para carreira de um jogador passar por General Severiano? "Até que enfim cheguei a um clube grande!", pensaria a maioria? "Agora, outros clubes poderão me ver e daqui a pouco, pego a ponte aérea!", seria recorrente na mente da turma? Ou ainda "Pior que tá não fica!"?
Dos 12 clubes considerados grandes no futebol brasileiro, o Botafogo é o que possui maior jejum de títulos representativos. Nosso último título fora dos limites do estado foi o Rio-São Paulo de 1998. A final do brasileiro de 1992 talvez tenha sido o último momento no qual o clube foi considerado de forma incontestável favorito em uma final (sem considerar os cariocas e suas nebulosas circunstâncias). Digo isso, considerando uma final perante uma equipe grande, pois em 1999, ser favorito não chegava a ser um grande mérito (talvez tenha até atrapalhado). Onde o clube perdeu o fio da meada?
Tive o grande privilégio de certa vez bater um longo papo com Wilson Gottardo. Ávido por curiosidades de 95, perguntei sobre como a equipe se preparou e qual foi o diferencial daquela conquista. Dentre tantas curiosidades e momentos de tensão que ele relatou (como por exemplo a garfada contra o Palmeiras), Gottardo disse que o diferencial daquela equipe era que já era sabido que eles sairiam de campo com a vitória, mesmo antes do juiz iniciar a partida. E não por uma questão de menosprezo pelo adversário, mas por uma questão de completo comprometimento, não com o Botafogo apenas, mas sobretudo com suas carreiras. Com essa mentalidade, o time trilhou o campeonato, sendo campeão com 14 vitórias, 9 empates e 4 derrotas. Gottardo revelou ainda que o grupo, mesmo sem saber como ficaria para 96, tinha um pacto para vencer a Libertadores. Mas o desmanche do time e a pancadaria no Sul impediram o feito. Ah, e isso tudo com meses de salários atrasados e estrutura demasiadamente precária. Hoje, o Botafogo tem um estádio (do qual todos estamos saudosos), estrutura de treinamento compatível com o padrão nacional, além de departamento médico considerado um dos melhores do país. Então porque brigar para não cair já nos parece um destino consolidado?
Sheik é um jogador nos moldes dos anos 90. Com excelência técnica incontestável na mesma proporção das polêmicas associadas à sua imagem. Mas é inegável que ele foi sóbrio nesse comentário e tocou num ponto onde o Botafogo empobreceu, se apequenou. No ano de 2013, Seedorf parece ter tentado algo parecido com o resgate que precisamos, mas talvez por ser pragmático além do que o boleiro brasileiro suporta, tenha sofrido resistência determinante. 2014 calou àqueles que insistiam em vender a ideia de que nossa torcida é frágil e ausente. Essa mesma torcida sabe que daqui em diante, estaremos na berlinda até a última rodada e que qualquer plano do tamanho do Botafogo será só para o ano que vem. Que chegue então o ano que vem, quem sabe com algum valor resgatado. E que sobre 2014 eu queime a língua!